A vitória de Donald Trump à presidência dos Estados Unidos complexificou ainda mais as negociações em torno do combate às mudanças climáticas. Os discursos de Trump demonstram que o caminho a ser seguido por seu governo será de confronto com pesquisadoras(es) e instituições, cujos estudos científicos comprovam a ocorrência e o agravamento do aquecimento global, com organizações da sociedade civil que se mobilizam nos quatro cantos do planeta exigindo mudanças significativas nas formas como produzimos, consumimos e geramos lixo; com os movimentos sociais anticapitalistas, com povos ancestrais e suas lideranças e com a nossa mídia alternativa. Se antes já havia demonstrações de que os críticos das negociações multilaterais voltadas ao atendimento dos interesses das grandes corporações são os verdadeiros inimigos, tal dúvida não existirá mais com Trump e seus aliados. Elon Musk, Bolsonaro e Milei, entre eles.
O problema é que sem os Estados Unidos qualquer negociação em torno do combate às mudanças climáticas estará fadada irremediavelmente ao fracasso, já que aquele país é o maior consumidor de petróleo do planeta, por exemplo. Para piorar o cenário, Trump pretende avançar a exploração de petróleo no Alasca, ampliar o emprego da técnica de fracking* para a extração de petróleo e gás de xisto e retirar os EUA de acordos internacionais, entre outras iniciativas. Some-se a isto, a disseminação/reafirmação do discursos negacionista, a desestruturação das políticas ambientais e dos órgãos de gestão, bem como o recrudescimento das pressões para que o país se apodere de recursos estratégicos ao redor do planeta (petróleo da Venezuela e o lítio da Bolívia, para citar apenas esses dois casos). O que significará a possibilidade de novas intervenções militares, apoio a golpes de Estado e envio de tropas se considerar necessário. O mundo imaginado por Trump é fundado no poder das armas, das revoluções coloridas, do preconceito, do patriarcado, do conservadorismo religioso, da defesa radical dos interesses dos mais ricos, da xenofobia e do racismo. Portanto, um mundo mais instável, autoritário, desigual e violento.
O que será da COP-30 em Belém do Pará sem os Estados Unidos nas mesas de negociações, ou sem comprometer-se realmente com os acordos a serem estabelecidos? Aliás, mesmo sem assumir compromissos significativos com o combate às mudanças climáticas, os Estados Unidos deverão empenhar-se para o aprofundamento das "alternativas de mercado", que é um dos itens que verdadeiramente lhes interessa: mercado de carbono, "soluções" a partir da geoengenharia, financeirização e outras. Por conseguinte, parece um tremendo equívoco apostar a maior parte das fichas nas negociações no interior da COP oficial, tal como defendido e/ou estimulado por determinados segmentos sociais, como as ONGs-empresas.
Soluções duradouras e estruturantes não sairão das COPs. Mesmo assim são arenas políticas que não podemos simplesmente desprezar. Contudo, sem a pressão das sociedades nacionais e suas redes de lutas internacionais, sem que estas sejam capazes de mobilizarem-se e realmente impor derrotas aos poderosos conglomerados econômicos e aos blocos de poder dos quais eles fazem parte, nosso futuro comum se torna mais e mais incerto. Por isso, esse processo deve contribuir para constituirmos nosso campo contrahegemônico, cuja utopia deve estruturar-se na construção de novas relações sociais e econômicas, das nossas sociedades com a natureza e mesmo com o sagrado, pois o capitalismo é morte. Simples assim. Nesse sentido, a Cúpula dos Povos pode de fato reunir em torno de si muitos dos segmentos comprometidos com mudanças estruturais na sociedade. E há também espaço para a formação de outras articulações do mesmo tipo.
A COP-30 em Belém pode tornar-se um marco histórico da intervenção das nossas sociedades e organizações nesse processo. Mobilizar, ocupar, resistir, pressionar, propor, cobrar, encurralar, constranger e denunciar deveriam ser alguns dos verbos a orientar o conjunto das nossas iniciativas. O problema é que há quem prefira restringir tudo ao verbo negociar, se possível, em salas climatizadas.
* A técnica é criticada por ambientalistas, que veem diferentes problemas no processo: contaminação do lençol freático por substâncias químicas, uso intensivo de água, degradação do meio ambiente e riscos para a saúde.