quinta-feira, 22 de outubro de 2015

Fico pensando...

Defendo o ponto de vista de que uma das grandes diferenças históricas entre a estratégia petista para alçar essa parcela de poder que é o executivo federal e as anteriores realizadas por partidos ou forças políticas de esquerda é que na primeira, além de ter conseguido "chegar lá", reside o fato de que o PT, seus dirigentes e grupos que controlam efetivamente o partido, passaram a se constituir em parte das elites dominantes no país. Nas experiências anteriores da esquerda, imersas na ideia de apoio a uma burguesia nacional não-imperialista, de luta contra um modelo feudal ou na convicção de que o país deveria passar por um "choque" capitalista, as forças de esquerda sempre estiveram a reboque, caudatárias mesmo, de poderosos grupos políticos e econômicos do Brasil e do exterior.

Com o PT a situação é diferente. Recomendo o leitura do livro escrito pelo uruguaio Raul Zibeck, intitulado Brasil Potência. Nele está registrado de modo muito interessante como o PT se preparou para chegar ao poder. O papel dos fundos de pensão na modernização do capitalismo brasileiro e o controle sobre eles exercido pelo partido, as mudanças ocorridas no mundo sindical, particularmente daquele segmento próximo ao PT, o controle da máquina governamental e por aí vai. Paulatinamente, ao longo dos anos, a elite petista, não dá pra estender isso ao conjunto da militância, passou a se constituir em parte orgânica da elite dirigente do país, as "classes dominantes". Essa é a diferença com processos pretéritos. Daí o porquê hoje é muito difícil contar com o apoio do partido às lutas contra o modelo neoextrativista de desenvolvimento, ou à expansão desenfreada de grandes projetos de infraestrutura na Amazônia. Dai ser cada vez mais difícil afirmar que ainda estamos do mesmo lado.

Entretanto, por mais contraditório que possa parecer, não é possível afirmar também que PT e PSDB são a mesma coisa. Não são. Há diferenças substanciais que precisam ser reconhecidas sob o risco de ignorarmos a complexidade do real. Por exemplo: O que seria do governo Morales (Bolívia) durante a retomada do controle do setor petroleiro num governo Aécio Neves? Ou as relações do nosso país com a Venezuela? Ou ainda com os Estados Unidos no que diz respeito à "guerra contra o terrorismo"? Na dimensão interna, o que seria da política de cotas? Haveria política de cotas? Em princípio isso pode parecer apenas penduricalhos diante da aplicação da ortodoxia macroeconômica, mas são mesmo questões insignificantes?

Por outro lado, há também confusão no que diz respeito ao nosso posicionamento em relação às tentativas da oposição de provocar o impeachment de Dilma Roussef. A defesa da democracia e de suas instituições - incluídas as nossas instituições como sindicatos, associações, fóruns, ONGs etc. - não é a defesa do governo. Ao nos posicionarmos contra o golpe desencadeado por forças conservadoras xenófobas, racistas e fascistas não estamos nos posicionando a favor do PT e seu bloco de poder, pois o que está em jogo não é o mandato presidencial, mas, fundamentalmente, o "ambiente" sob o qual queremos desenvolver as nossas lutas de resistência. Particularmente estou anos-luz de distância da concepção de que as crises levam necessariamente a uma situação melhor, em que o "povo assume as rédeas de seu destino". Os processos ocorridos no Egito e em outros países que passaram por intensas mobilizações a partir de 2010 no mínimo levantam dúvidas sobre tal ponto de vista. Isto ocorre justamente porque a "história é um livro em aberto". Ou seja, nada está dado de antemão. Podemos tanto avançar para uma situação qualitativamente melhor, como podemos regredir a uma situação de barbárie.

Então, temos que abrir mão das mobilizações e das iniciativas de reconstruir um bloco de esquerda no Brasil? Não! O PT e alguns de seus aliados não se colocam mais na perspectiva de destruir o capitalismo. Nessa questão fundamental já não comungamos das mesmas perspectivas. Contudo, se for preciso ir às ruas para lutar contra o impeachment lá estarei porque, como disse, o que está em jogo é muito mais que um mandato.

Fico imaginando cá com os meus botões o que teria acontecido se os comunistas e os sociais-democratas tivessem se unido contra os nazistas a partir do final da década de 1920. Não tem relação direta com o que foi escrito acima. Só fico pensando... Será?


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