segunda-feira, 10 de junho de 2024

Os/As extremistas estão chegando. Estão chegando os/as extremistas.

 E eis que a extrema-direita saiu fortalecida na eleição ocorrida neste último final de semana ao parlamento europeu, particularmente em países como Alemanha, França e Itália. Os discursos de ódio, antimigração e contra as instituições democráticas ganharão mais espaço ainda nas agendas político-ideológicas. Evidentemente, tais resultados tendem a repercutir para além das fronteiras europeias. Caso Trump não seja impedido legalmente de concorrer às eleições estadunidenses e as vença, o quadro favorável ao extremismo se acentua ainda mais. Uma das questões que se coloca no momento é: esses resultados eleitorais são somente uma "nova" onda conservadora, ou na realidade se trata de uma tendência em escala global?

No Brasil, creio eu, não compreendemos nos devidos termos todo o significado do que foi o governo Jair Bolsonaro. Com este, os grupos sociais extremistas ganharam voz e visibilidade. O que temos hoje são movimentos sociais com grande capacidade de mobilização, capazes de interferir e pautar a agenda política nacional e que vêm crescendo em todos os cantos do país, mesmo que não uniformemente. Um projeto que articula poderes econômico e político (controle de territórios e dos recursos neles disponíveis, destruição de garantias constitucionais, fragilização das legislações socioambientais, expansão do agronegócio, padronização socioprodutiva e das paisagens etc.), fé e religião (defesa da submissão a autoridade dos/das pastores(as) e projeto de poder fundado na teologia do domínio), comunicação de massa, contínuo avanço sobre o aparelho de Estado (representação parlamentar e controle sobre órgãos de segurança pública, por exemplo), a relativização da verdade (a verdade virou mera opinião distribuída fartamente pelas redes sociais confrontando, inclusive, aquelas demonstradas cientificamente, vide o caso dos segmentos antivacina, e onde a mentira é tão somente a ponta do iceberg desse processo mais profundo); adoção de medidas para avançar o controle dos homens sobre o corpo, a mente e o trabalho da mulher, tornando-as políticas governamentais; racismo, xenofobia e homofobia.

Chega a ser risível as análises de que não podemos contribuir para o acirramento das disputas político-ideológicas no país. A extrema-direita e seus aliados fazem isto diuturnamente, pois tomaram para si a iniciativa de enfrentar e derrotar a esquerda e os setores progressistas do país. Num cenário como esse há quem pense no nosso campo que o zero a zero é um ótimo resultado. Afinal, de acordo com esse "ponto de vista", o gol é um mero detalhe.

quinta-feira, 6 de junho de 2024

Um Barbalho, dois Barbalhos, três Barbalhos...

Circula pelos meios políticos a informação de que Helder Barbalho (PMDB) possui 82% de aprovação somente na capital paraense. Mesmo que o índice não chegue a tanto é notório a ampla base de apoio político e popular alcançado por ele não somente aqui, mas em todo o estado. Tal situação é fruto de um conjunto de fatores, tais como execução de diversas e vistosas obras públicas, eficiente e profissional estratégia de marketing/propaganda, a incorporação à estrutura de governo de caciques das mesorregiões Oeste e Sul/Sudeste do Pará na tentativa de controlar os descontentamentos das elites locais e com isso arrefecer o ímpeto separatista das mesmas, além da construção de amplo leque de alianças políticas que agregam desde segmentos neopentecostais bolsonaristas até parcela de setores progressistas, como o Partido dos Trabalhadores (PT). É também digno de nota o choque de imagem que Helder promoveu ao longo dos últimos anos, desde que foi prefeito do município de Ananindeua, integrante da Região Metropolitana de Belém, revertendo em grande medida a antipatia e ojeriza que parte significativa da população paraense nutria contra as famílias Barbalho e Zaluth, esta última a vertente da mãe do governador.


A habilidade demonstrada para articular apoios partidários, bem como parcerias com organizações da sociedade civil não encontra paralelo em outros governos. Ao menos desde a retomada das eleições para governador em 1982. Talvez a referência mais próxima seja justamente com o primeiro governo do pai dele e atual senador, Jader Barbalho. O clamor popular pelo fim da ditadura e a possibilidade concreta de infligir derrota eleitoral contra os militares e sua base civil/empresarial fez com que diversos setores da esquerda à época se somassem à campanha e depois ao governo de Jader. Foram os casos, por exemplo, de parcela do então Partido Revolucionário Comunista (PRC) - parte abrigada no MDB e outra no PT -, MR-8, PCB e PC do B. De lá para cá nenhum outro mandatário havia conseguido tal feito. Helder, sim. Seu governo é uma colcha de retalhos de siglas partidárias. O que lhe garante céu de brigadeiro não somente no parlamento. O Tribunal de Contas do Estado (TCE) que o diga.

O "novo" modelito barbalhiano inclui também a recauchutagem no discurso político-ideológico. Profundamente comprometido com as alternativas de mercado às crises climática e ambiental, Helder abraçou a economia verde como elemento estruturante da sua estratégia, inclusive para alçar voos mais longos. Com isso, cacifou-se diante de diferentes setores da comunidade internacional - ONGs, governos e grupos empresariais -, trouxe para sua base segmentos dos movimentos sociais e tornou-se o principal interlocutor do governo Lula na Amazônia. Com Helder Barbalho a bioeconomia passou a ser um mantra, que a tudo justifica e promove.


Entretanto, o lado B helderiano comporta sólidos compromissos com o agronegócio (soja e dendê, em especial), mineração, madeireiros, empresas dos setores logístico e de cosméticos e, como não podia deixar de ser, com consultores, certificadores e investidores do mercado financeiro vinculados à economia verde. Por trás disso tudo, a implementação de diferentes iniciativas para garantir acesso aos territórios de povos indígenas e de comunidades tradicionais, além de áreas de conservação ambiental, à exploração empresarial nacional e transnacional. O mercado de carbono, com estímulo à assinatura de contratos de crédito de carbono por parte das comunidades, e a Lei de Terras, esta aprovada pela Assembleia Legislativa do Pará, servem de exemplo.

Enquanto isso, os crimes socioambientais continuam a solta no estado. É o que ocorre no município de Barcarena, cujo Distrito industrial até hoje não possui sequer licença ambiental. Também podemos incluir as ações das mineradoras Hidro e Imerys em territórios quilombolas (no município de Moju, por exemplo) e do povo Tembé (Tomé-Açu); o apoio irrestrito à construção da Ferrogrão - que promoverá destruição em larga escala nos territórios do povo Munduruku (Oeste do Pará), a instalação de portos que atingirão diversas comunidades ribeirinhas - Maicá, em Santarém, e no Baixo Tocantins.


Outro passo importante na recauchutagem da imagem familiar foi o estabelecimento do "acordo de paz" com os Maiorana, representantes locais das organizações Globo. Evidentemente, tal acordo passou pela retomada da veiculação de propaganda oficial nos veículos de comunicação de propriedade daquela família, entre outras medidas. O fato é que os "radicais" da família perderam poder interno e Helder passou a contar com a "simpatia" do grupo empresarial.


A tendência predominante é que Helder Barbalho eleja a maior parte dos(as) prefeitos(as) e dos(as) vereadores(as) paraenses em outubro próximo, com a direita/extrema-direita dentro e fora desse arco de alianças conquistando fatia importante dos governos locais. Já os setores progressistas e de esquerda devem manter-se como coadjuvantes nesse processo. Nada indica o contrário até este momento.


A perda das eleições em Belém por parte da esquerda é uma possibilidade real. Eder Mauro, o pré-candidato de extrema-direita, tem chances de obter uma votação relevante. Contudo, quando Helder colocar as máquinas governamental e partidária para funcionar as chances do delegado miliciano devem reduzir-se consideravelmente. Talvez, para Eder Mauro, as próximas eleições sejam apenas um teste em vista do seu objetivo principal: eleger-se senador em 2026.

Uma das formas de enfrentar esse processo avassalador passaria pelo estabelecimento de alianças estratégicas dos movimentos sociais em torno de candidaturas de esquerda nos diferentes municípios. Creio ser um  erro deixar tarefa tão importante nas mãos exclusivas das direções partidárias e às suas lógicas internas de disputas, porque precisamos de pessoas comprometidas com as lutas populares e suas pautas. Para nós, pouco adianta que sejam eleitas figuras que, mesmo sendo de partidos de esquerda ou do campo progressista, estejam mais próximas de uma agenda liberal - a consolidação do mercado de carbono, por exemplo. É importante que as eleições sejam mais um passo na construção de um campo contrahegemônico. É disso que precisamos.