sexta-feira, 12 de outubro de 2018

Carta aos meus parentes e amigos.

Uma coisa é certa: seja qual for o resultado das eleições o Brasil sairá delas profundamente dividido e marcado por conflitos sociais e políticos. Daí que o próximo governo deve ter como bandeira prioritária a pacificação do país, combatendo todas as formas de violência, executando políticas sociais para superar as profundas desigualdades que atravessam nossa sociedade, valorizando a democracia e suas instituições, implementando medidas econômicas geradoras de emprego de qualidade em larga escala, enfrentando a corrupção, fortalecendo a inserção soberana do Brasil no plano internacional e, fundamentalmente, contribuindo para a consolidação de valores como a solidariedade e lutando intransigentemente contra a discriminação de gênero, raça, etnia e sexual. Esse deve ser o compromisso do novo mandatário. Contudo, é justamente isso que não acontecerá, caso Jair Bolsonaro se eleja. Ele já deu provas através de discursos, das propostas defendidas no Congresso Nacional e da campanha eleitoral que não tem compromisso com a defesa dos direitos dos trabalhadores, não possui as qualificações necessárias para administrar o país e nem para pacificá-lo. Neste caso, a não ser fazendo com que seus opositores "desapareçam".
Uma tristeza toma conta do meu peito.
Defensor declarado da ditadura militar, da tortura e do armamento da população, da liberação para que a polícia mate, da discriminação de negros, homossexuais e mulheres e da subordinação do nosso país, ele será uma causa a mais de instabilidade e de conflitos do que de paz.
Ao longo da campanha busquei apresentar argumentos, divulgar informações que considerei importantes para a análise crítica do currículo daquele candidato, tentei evidenciar os riscos que todos nós corremos com a possibilidade de sua eleição. Da minha parte digo que votaria em qualquer candidato que estivesse contra ele no segundo turno. Absolutamente qualquer um, pois Bolsonaro é a manifestação do ódio, da intransigência e da violência. Não há dúvidas quanto a isto.
Sinto uma dor profunda vendo parentes e amigos supostamente crentes a Deus fazendo apologia a tortura como se o próprio Cristo, ele mesmo não tivesse sido vítima de torturadores. Dói ler as piadas baseadas em atos de violência contra mulheres, negros e homossexuais. Dói ler as justificativas que são dadas para defender o indefensável. Fico me perguntando: Quem são essas pessoas com quem convivi a vida inteira e simplesmente não as conhecia? Como não percebia todo o rancor que lhes dominava a mente e o coração? O que pensavam de mim quando lhes falava do meu trabalho junto a comunidades indígenas, quilombolas e camponesas? Será que no íntimo diziam "olha lá o otário, o idiota", "pra que defender essa gente", "índio tem mais que morrer mesmo", "essa gente só atrapalha o desenvolvimento", "lá vem aquele chato falar de política"? Será que essas eram as ideias que lhes percorriam a mente? Como não notei? Por que fechei os olhos?
Enquanto escrevo isto lembro da minha prima Inídia, uma mulher batalhadora. Cria sozinha o filho especial. O amor dela por ele é comovente. O que será dele com os cortes no orçamento para a saúde dessas pessoas, inclusive apoiada pelo deputado Bolsonaro? E o meu sobrinho Anderson que pensa em fazer faculdade num momento em que o filho do candidato da extrema-direita afirma que as universidades serão privatizadas. Vai ter que abrir mão desse sonho? E o meu filho músico, negro. Será ele vítima da corja de fascistas que andam atacando nas ruas as pessoas que se opõem ao candidato Bolsonaro? Sinto medo. Porém, o medo agora não é somente do Bolsonaro e de suas ideias, mas passei também a ter receio dos que me rodeiam, pois não os conhecia.
Por fim, devo dizer que Bolsonaro no poder resultará na morte de muitos(as) indígenas, camponeses(as), quilombolas e agricultores(as), pois os aliados do candidato - empresas, bancos, fazendeiros, madeireiros e outros - querem a todo custo tomar suas terras e a eleição daquele candidato será uma espécie de "carta-branca" para toda sorte de atrocidades contra eles. E se isso acontecer um pouco do sangue dessas pessoas estará também nas mãos dos que nas eleições apoiaram o autoritarismo, o fascismo. Estarei com aquelas pessoas, mesmo que para isso tenha que virar as costas para amigos e parentes. Infelizmente...
Certa vez, Jesus estava com seus discípulos e a multidão, quando alguém lhe disse: “Sua mãe e seus irmãos estão ali fora e querem vê-lo”. Jesus respondeu: “Minha mãe e meus irmãos são aqueles que ouvem a palavra de Deus e a colocam em prática” (Lucas. 8,19-21)

2 comentários:

Pantoja Ramos disse...

Vamos meu irmão. Vamos à luta. Levanta - te e com serenidade vamos caminhar pela História.

Tânia Miranda disse...

Meu bem,

Jesus foi traído, muitos dos que o ouviram, o seguiram e conviveram com ele, não entenderam a sua mensagem, em particular os homens que fugiram quando ele foi preso, torturado e morto pelo poder religioso-político do Império Romano, não só do poder da época, mas de gente humilde que foi aderindo a ideologia machista 'os impuros' - mulheres, crianças, doentes. Somente as mulheres acompanharam o seu sofrimento, estiveram ao seu redor - Maria, Marta, Madalena a sua mãe Maria, Simão Cireneu, a mulher que ungiu os seus pés estes, não conviviam com Jesus, mas entenderam a mensagem. Depois as mulheres foram ao túmulo (imaginaram a ressurreição) e saíram anunciando a mensagem e formaram as comunidade (inclusive Maria mãe de Jesus). Elas sim entenderam a mensagem...
Teoricamente as 12 tribos de Israel vivam em regime de comunidade, mas o povo hebreu foi conduzido a 'nós queremos um Rei, e ganharam um Rei.
Assim como em determinado momento da história como nos diz Deleuze “que as massas não foram enganadas, elas efetivamente desejaram o fascismo! E tiveram os governos fascistas.
Não se culpe assim, a sua sentença final em abandonar parentes em amigos condiz com o seu sentimento de decepção, eu estou assim também. Eu digo sempre – “A dor, o amor, a vida – Tudo passa!”. Vamos caminhar, mesmo gemendo e chorando, temos que caminhar. Grande abraço!